Conferência Livre para DTNs abre portas para
discussões de enfrentamento a nível local e nacional
Com o objetivo de evidenciar prioridades no combate das Doenças Tropicais Negligenciadas, evento levantou discussões em consonância com a 17° Conferência Nacional de Saúde, agendada para julho deste ano
A Conferência Livre para Doenças Tropicais Negligenciadas: “Agir agora. Agir juntos. Investir em DTNs” trouxe demandas urgentes para comunidades atingidas por enfermidades consideradas invisíveis aos olhos das políticas públicas, da ciência e da indústria farmacêutica. Realizada no dia 2 de fevereiro na sede da Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (SESA), o encontro buscou construir um espaço de diálogo sobre doenças que têm a desigualdade e a pobreza como causa e consequência, incluindo hanseníase, hepatites virais, doença de Chagas, malária, entre outras.
Realizado antes dos ciclos de conferências municipais e nacional, esse foi o primeiro evento do tipo em Fortaleza construído por organizações e movimentos sociais como a NHR Brasil e o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), reforçando a importância das conferências como espaços participativos para a elaboração de políticas públicas. Além de representantes de esferas do governo estadual e municipal voltadas à saúde, participaram acadêmicos e lideranças que trouxeram relatos importantes para o enfrentamento das DTNs no Brasil.
Como apontou Aymée Medeiros, gestora do Programa PEP++ da NHR Brasil e mediadora do encontro, uma das principais características das doenças negligenciadas é que elas são acompanhadas de índices inaceitáveis em termos de desenvolvimento humano e social, que afetam sobretudo as populações mais vulneráveis. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), quase 2 bilhões de pessoas em todo o mundo são acometidas por pelo menos uma das 20 doenças listadas pela entidade. Considerando apenas a América Latina e o Caribe, o Brasil concentra cerca de 90% dos casos.
“Por esse motivo, estratégias de melhorias nos processos de diagnóstico e atenção integral às pessoas diagnosticadas são imprescindíveis para o enfrentamento dessas doenças”, argumentou a gestora. Além disso, ela enfatizou que o estigma e o preconceito são barreiras que dificultam o acesso à saúde para pessoas acometidas por este grupo de doenças.
Vaudelice Mota, chefe de Políticas de Saúde da Secretaria de Saúde do Ceará, demonstrou preocupação com a significativa queda nas notificações dessas doenças e o crescimento acentuado da taxa de letalidade, fato agravado em grande parte pela pandemia de Covid-19.
“Nossa expectativa é ver as doenças negligenciadas incluídas de forma efetiva na agenda pública local e nacional. Para isso, precisamos do comprometimento de todos para disseminar informações, enfrentá-las e acolher as pessoas acometidas”, destacou a secretária.
Fórum DTNs
Diversos pontos abordados na conferência reforçaram os compromissos difundidos em carta aberta pelo 7º encontro do Fórum Social Brasileiro de Enfrentamento das Doenças Infecciosas e Negligenciadas, lembrou Alberto Novaes, professor da Faculdade de Medicina da UFC e infectologista/epidemiologista parceiro da NHR Brasil.
Segundo o professor, o desafio é mais amplo do que apenas fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS). Ele inclui a necessidade de mais comunicação entre equipes multidisciplinares, maior visibilidade sobre os dados que envolvem as pessoas afetadas e uma postura mais comprometida por parte da atenção básica e das redes de cuidado em garantir o acesso a diagnóstico e tratamento.
“Não há como falar em DTNs sem pensarmos no desenvolvimento e na ampliação dos pontos de atenção dos serviços de referência, além de uma política de vigilância e atenção permanente. Precisamos trabalhar para ampliar as linhas de cuidado tanto na atenção primária como na especializada, ainda mais considerando a dinâmica migratória para atendimento em Fortaleza.", salientou Alberto.
Investimentos
Há 19 anos lutando pelo enfrentamento das hepatites virais, a enfermeira e presidente da Associação Cearense dos Pacientes Hepáticos e Transplantados (Acephet), Maria Susana, reforçou a necessidade de mais investimentos em campanhas e pesquisas, principalmente para o desenvolvimento de fármacos e imunológicos.
“Precisamos conscientizar a população sobre o quão sérias são essas doenças, que podem causar desde deficiências permanentes até a morte. Que possamos nos fortalecer enquanto coletivo e envolver cada vez mais atores nessa luta”, reforçou Susana.
No final do evento, foram aprovadas uma série de propostas que serão encaminhadas pela NHR Brasil e Morhan Fortaleza diretamente para a 9ª Conferência Municipal da Saúde, cuja data ainda será definida. A 17ª Conferência Nacional de Saúde, com o tema “Garantir Direitos e Defender o SUS, a Vida e a Democracia – Amanhã vai ser outro dia”, será realizada de 2 a 5 de julho de 2023, em Brasília.