Carta do Fórum DTNs pauta solenidade de abertura do Medtrop 2023
Realizado nos dias 09 e 10 de setembro em Salvador, encontro levou propostas para a promoção da saúde de pessoas acometidas por doenças negligenciadas
O 8º Fórum Social Brasileiro de Enfrentamento das Doenças Infecciosas e Negligenciadas (Fórum DTNs) concluiu suas atividades no último domingo (10) com a produção, distribuição e leitura da Carta Aberta de Salvador a autoridades de saúde pública na abertura do Medtrop 2023. Envolvendo organizações e movimentos sociais, o momento contou com a leitura da carta para mais de 2 mil congressistas por Amélia Bispo, liderança e presidente da Associação de Chagas da Bahia (Achaba).
A solenidade foi acompanhada por diferentes lideranças do coletivo, que exibiram cartazes com frases de luta e empoderamento para a ampliação do acesso a tratamento oportuno, diagnóstico e prevenção a doenças negligenciadas, entre outras demandas.
Em sua fala, Amélia destacou a necessidade de fortalecer a Atenção Primária à Saúde e incluir as Doenças Negligenciadas como pauta prioritária das equipes em seus territórios de atuação no SUS, em estreita articulação com a Vigilância em Saúde.
“Ao longo do nosso oitavo encontro, em que reconhecemos que dias melhores virão para o nosso povo no SUS, vimos a necessidade de reivindicar linhas de cuidado mais amplas e adequadas, promover a articulação intersetorial, ampliar os financiamentos em pesquisas e o acesso a medicamentos, além de medidas mais consistentes contra o racismo institucional para combater a discriminação às pessoas acometidas por Doenças Negligenciadas”, salientou Amélia.
O momento emocionante impactou os demais presentes na mesa de abertura. Mitermayer Galvão, médico e presidente do Medtrop 2023, frisou a importância do Fórum para o reconhecimento da necessidade de pesquisas com impactos voltados às comunidades atingidas. “O Fórum DTNs é extremamente respeitado pelos membros da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT). Tanto que prezamos para que as pesquisas sejam feitas para as pessoas para as quais trabalhamos, que é a população brasileira, sem deixar de lado as diferentes realidades que temos em nosso território”, pontou.
Nésio Fernandes, médico sanitarista e Secretário de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde, aclamou as reivindicações da Carta. “A gestão pública precisa saber ouvir, sentir e pisar o pé onde as pessoas vivem. A distância administrativa natural que existe entre nossos gabinetes lá em Brasília para aquilo que acontece nos territórios, impede que a gente tenha um sentimento de urgência e pressa, assim como um domínio profundo sobre as realidades que existem no país. É por isso que reconhecer os territórios, o controle da atenção primária à saúde e as pessoas que vivem naqueles espaços é fundamental”, destacou o secretário.
Programação
Nesta edição, o Fórum foi sediado em dois espaços: o Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA) no sábado (09) e o Centro de Convenções de Salvador no domingo (10). Ao longo dos dois dias, o coletivo gerou discussões férteis no âmbito das questões emergenciais e necessárias voltadas a pessoas cometidas por hanseníase, doença de Chagas, leishmanioses, hepatites virais e outras enfermidades. O Fòrum também foi transmitido online pelo canal do Youtube do Medtrop 2023. Confira aqui.
A mesa de abertura do encontro contou com representantes de diversos núcleos da esfera da saúde pública. Entre os presentes estavam Alexandre Menezes, diretor da NHR Brasil e coordenador do Fórum; Amélia Bispo, representante das lideranças; Luís Eugênio Portela e Joilda da Silva Nery, diretor e vice diretora do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA; Ana Clebeia Nogueira, coordenadora da Comissão Intersetorial de Atenção à Saúde das Pessoas com Patologias; Miguel Aragón (OPAS); Mitermayer Galvão, presidente do Medtrop 2023; Cláudio Salgado (APS) e Alda Cruz, diretora do Departamento de Doenças Transmissíveis. O momento foi mediado por Diogo Galvão, representante do DNDi (Drugs for Neglected Diseases Initiative).
Alexandre Menezes destacou a possibilidade de integração que o evento proporciona, incluindo a inserção de perspectivas de quem convive com as doenças negligenciadas nas discussões científicas propostas pelo congresso. “Nesse encontro de Salvador, temos lideranças participando integralmente de todo o Medtrop. E essa é uma oportunidade não somente para as lideranças, mas principalmente para os pesquisadores. Por muito tempo na ciência, nós estivemos falando para os nossos pares. Mais do que nunca, nós precisamos escutar mais a comunidade enquanto academia”, ressaltou Alexandre.
Lideranças, pessoas que foram ou são acometidas pelas enfermidades invisibilizadas e que hoje são protagonistas na busca por seus direitos à saúde compartilharam seus relatos de enfrentamento ao estigma e à luta diária que é lidar com as sequelas e os sintomas resultantes das DTNs pelas quais são atingidas. Os relatos evidenciam as carências na atenção às enfermidades retratadas no Fórum, o que vai além da necessidade de conhecimento técnico, explica Fábio Correira, integrante do Comitê Pernambucano de Mobilização Social para o Controle da Tuberculose
“Um profissional de saúde pode ter a compreensão sobre as doenças, mas ele não tem a vivência de alguém acometido. Uma vez que as doenças são determinantes sociais, não são apenas as pessoas acometidas que precisam de atenção, mas toda a sociedade civil que está vivenciando essas negligências”, destacou.
A partir desses relatos e da contribuição de demais organizações, participantes acadêmicos e profissionais de saúde, foi desenvolvida em conjunto a 8ª Carta Aberta do Fórum Social Brasileiro de Enfrentamento das Doenças Infecciosas e Negligenciadas.
A construção do documento contou com a divisão do grupo a partir da discussão de demandas relacionadas aos seguintes pontos: Atenção Integral e Articulação Intersetorial, destacando a importância da promoção de processos de construção de medidas voltadas para as DTNs que envolvam todas as partes da sociedade, como universidades, profissionais da área da saúde e indivíduos da comunidade em geral; Fomento à Ciência, Tecnologia e Inovação voltada às DTNs, a fim de fortalecer a infraestrutura de saúde e inovação no País; Promoção de Educação em Saúde, incitando que o conhecimento sobre as enfermidades retratadas no fórum sejam difundidos por meio de políticas efetivas de educação; Garantia que as organizações da Sociedade Civil estejam em consonância e a par dos processos de construção e planejamento das políticas públicas em saúde; além de Direitos Humanos e Acesso a Medicamentos.
A Carta Aberta tem sua mensagem destinada a toda a sociedade civil do Brasil, mas pretende impactar primordialmente o Governo Federal, assim como as autoridades sanitárias em níveis federal, estadual, regional e municipal, a comunidade acadêmica no campo da saúde, do direito e da educação.
Os participantes do 8º Fórum DTNs concluíram suas atividades refletindo sobre as possibilidades para as próximas edições. “Nosso ponto forte são nossas vivências, nossas histórias. Então, vemos nitidamente na fala de uma pessoa acometida a força e a grandeza que esses relatos possuem. Mas essa força adquirida é uma questão de sobrevivência”, revelou Paulo Rodrigues, liderança do Morhan Piauí, ao justificar a necessidade de o Fórum manter sua essência de dar “brilho” as vozes das pessoas atingidas pelas DTNs.