Dia Internacional da Luta pela Saúde da Mulher
e da Prevenção da Mortalidade Materna
Este domingo, 28, foi o dia Internacional da Luta pela Saúde da Mulher e da Prevenção da Mortalidade Marterna. A data é uma oportunidade para falarmos dos direitos das mulheres acometidas pela hanseníase.
Em 1984, no IV Encontro Internacional Mulher e Saúde na Holanda, o dia 28 de maio foi definido como o Dia Internacional da Luta pela Saúde da Mulher. O evento, que ocorreu durante o Tribunal Internacional de Denúncia e Violação dos Direitos Reprodutivos, foi marcado pela discussão sobre a prevenção da mortalidade materna.
Na edição seguinte do Encontro Internacional Mulher e Saúde, que foi sediado em São José da Costa Rica, a Rede de Saúde das Mulheres Latino-Americanas e do Caribe (RSMLAC) propôs que em cada dia 28 de maio uma temática traria atenção à políticas públicas que visassem prevenir mortes maternas evitáveis.
A data também faz alusão aos diversos problemas de saúde que comumente acometem as mulheres, como o câncer de mama, endometriose, câncer do colo do útero, fibromialgia, depressão e obesidade.
Saúde da mulher acometida pela Hanseníase
A ocasião é uma oportunidade para reforçar o comprometimento com a promoção da saúde da mulher em sua integralidade. Essa tarefa acaba se tornando um desafio de ser alcançado nos casos de doenças negligenciadas, como a hanseníase, já que vários fatores como o estigma, reações do tratamento e a falta de apoio familiar e psicológico impactam no processo de cura das mulheres acometidas.
Marly Araújo, fundadora do Gamah (Grupo de Apoio a Mulheres Atingidas pela Hanseníase), destaca a triste realidade que observou em seu trabalho de apoio às mulheres acometidas pela doença, onde muitas relataram terem sido abandonadas por seus parceiros quando receberam o diagnóstico.
Esse contexto é comprovado pelo estudo produzido pelas universidades de Stanford, Utah e pelo Centro de Pesquisa Seattle Cancer Care Alliance que apresenta que as mulheres correm 6 vezes mais risco de serem abandonadas por parceiros após o diagnóstico de doenças raras.
Além disso, Marly destaca que o fator econômico é um dos fatores que dificultam a continuidade do tratamento principalmente de mulheres com filhos, já que nos casos mais graves de hanseníase a pessoa acometida pode desenvolver sequelas incapacitantes que dificultam a sua permanência no trabalho. “Essa mulher vai ter que trabalhar para sustentar seus filhos, mesmo se sequelando ela continua trabalhando porque a mãe não abandona o filho”, aponta ela.
Suporte psicológico e estigma
O fator emocional é colocado por Marly como outro aspecto que impacta no tratamento da mulher acometida pela hanseníase, “elas acabam achando que nunca mais vão refazer a vida, não aceitam o diagnóstico e acabam abandonando o tratamento”, diz ela.
Por este motivo, Marly reforça a necessidade do acompanhamento psicológico da mulher atingida pela hanseníase. Esse suporte é garantido no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Hanseníase (PCDT, 2022), Marly revela, no entanto, que na realidade a medida não é cumprida e esse papel, por vezes, é ocupado por organizações como o Gamah, que fornecem um espaço seguro para que essas mulheres compartilhem suas angústias acerca dos desafios vividos em sua jornada com a hanseníase.
O estigma da hanseníase é outro aspecto que implica na situação psicossocial da mulher acometida pela doença. Hellen Xavier, psicóloga, mestre em saúde pública e gestora de projetos da NHR Brasil, explica que apesar de ser uma enfermidade que possui tratamento e cura, ainda há uma série de representações históricas da hanseníase que são estigmatizantes.
Ao analisar esse cenário sob uma perspectiva de gênero, a compreensão de como esse estigma recai sobre a mulher com hanseníase é benéfico para construção de políticas de proteção da saúde em sua integralidade.
"O estigma tem esse poder de impactar no surgimento de outras doenças, mas no sentido psicológico ou até imunológico”, ressalta Héllen. Considerando uma visão ampliada da saúde física, psicológica, social e analisando os determinantes sociais é possível estabelecer que a figura da mulher já está em um espaço de vulnerabilidade social, muitas vezes expostas a violências de gênero.
Héllen reforça que mecanismos para a utilização dos serviços públicos devem ser desenvolvidos para identificar e combater os diversos tipos de estigma e discriminação que as mulheres acometidas pela hanseníase estão sujeitas, “garantindo que elas possam receber o tratamento adequado, o apoio e o acolhimento. Acho que a mensagem é essa, acolher para cuidar”, adiciona ela.
Hanseníase e a gravidez
O PCDT da Hanseníase de 2022 alerta para as comprovações científicas que indicam a incidência de reações hansênicas tipo 1 nos primeiros meses da gestação. Este tipo de reação, também classificada como reação reversa, está relacionada com o aumento da atividade do sistema imunológico da pessoa atingida pela enfermidade que está combatendo o bacilo da hanseníase. Esta situação condiz com um processo inflamatório agudo onde quer que haja bacilos de hanseníase no corpo principalmente na pele e nos nervos.
Existe também a reação hansênica tipo 2, onde o medicamento de escolha para o tratamento é a Talidomida. Entretanto, o seu uso durante a gestação é proibido devido aos potenciais riscos de malformação fetal, explica a médica dermatologista e hansenologista, Juliana Ramos.
Clódis Maria Tavares, enfermeira e doutora em ciência pela EERP-USP que pesquisou durante sua vida acadêmica a hanseníase sob uma perspectiva de gênero, esclarece que as alterações hormonais da gestação podem comprometer o sistema imunológico da mulher, propiciando o surgimento de reações hansênicas, caso esta mulher seja acometida pela doença.
Em seu estudo Ciclo Gravídico Puerperal Associado Às Reações Hansênicas: Um Olhar Pela Enfermagem (Carvalho RKAL de, Tavares CM, Oliveira e Silva JM de et al, 2015), Clódis e as demais autoras recomendam que a gravidez em pessoas com hanseníase deva ser evitada, até que a doença tenha sido controlada e tratada, pois: “a probabilidade de ocorrer episódios reacionais é alta e o manejo de pacientes grávidas com reação hansênica é mais difícil em razão dos efeitos adversos da corticoterapia prolongada”, explica a pesquisadora em seu estudo.
Clodis ressalta a importância das mulheres em idade fértil serem acompanhadas e integradas ao programa de planejamento familiar, para que estas estejam a par das possibilidades contraceptivas que poderão ser utilizadas a fim de prevenir a gravidez durante o seu processo de tratamento da hanseníase.
Assim sendo, os profissionais de saúde devem ser capacitados, a fim de, não somente compreenderem a complexidade desses casos, mas também estarem aptos a atenderem mulheres em idade fértil com Hanseníase, recomendando e divulgando sempre a participação no programa de planejamento familiar.