Um pilar essencial da Educação em Saúde é a Atenção Primária à Saúde (APS). Porta de entrada para o SUS, o nível de cuidado primário é comumente o primeiro contato do paciente com os serviços de saúde. Por isso, destacamos aqui estratégias e experiências de profissionais da APS na prevenção da hanseníase e na promoção da saúde integral das pessoas acometidas pela enfermidade.
Vera Saldanha, Agente Comunitária de Saúde (ACS) da Unidade Básica de Saúde (UBS) Hélio Góes de Fortaleza (CE), trabalha em sua profissão há 17 anos, e explica sobre a importante missão da sua área.
“Nosso principal papel é orientar, é levar a informação da unidade básica de saúde à população”, explica Vera. Ela ainda adiciona que os ACS trabalham identificando casos de pacientes na própria comunidade, realizando o caminho inverso: o de levar a informação da comunidade para a unidade de saúde.
Esse processo nem sempre é fácil. O que leva os profissionais como Vera a construírem estratégias para aumentar a adesão da comunidade aos serviços de saúde. A ACS cita como exemplo o planejamento de ações com atividades recreativas com grupos de pacientes específicos, como os de pessoas acometidas pela hanseníase, para atrair a comunidade e incentivar o uso dos serviços de saúde pública.
Vera considera esses momentos valorosos para a construção do laço entre a UBS e a comunidade. “Tem gente que vai todos os dias. Às vezes moram sozinhos e veem ali um lugar de convivência”, comenta ela. O espaço da UBS é, portanto, um acesso importante para a educação em saúde da população.
A APS na detecção precoce e conscientização sobre a hanseníase
Fernanda Aguiar, Enfermeira da Estratégia Saúde da Família de Fortaleza e Mestranda em Saúde da Família pela Universidade Federal de Fortaleza (UFC), compartilha que esse potencial pode ser bem utilizado na conscientização sobre doenças como a hanseníase.
Esse processo envolve um esforço de múltiplos profissionais. Em sua rotina como enfermeira, Fernanda já orientou os profissionais da APS sobre a busca ativa de novos casos da doença.
A enfermeira, na ocasião, indicava aos ACS a aplicação do Questionário de Suspeição de Hanseníase (QSH) na avaliação de casos suspeitos da doença. A ferramenta, de autoria dos médicos Dr. Fred Bernardes Filho e Dr. Marco Andrey Cipriani Frade, foi criada para auxiliar na identificação e no diagnóstico de novos casos de hanseníase. O documento apresenta uma série de questões sobre sinais e sintomas da doença a serem aplicadas na hora da avaliação do paciente.
Aymée Medeiros, chefe de pesquisa da Fundação NHR Brasil, explica que o diferencial da ferramenta é a sua estrutura desenvolvida em uma linguagem simples. O que torna sua aplicação mais descomplicada na rotina dos ACS. Além disso, o documento facilita a suspeição para além dos sinais das manchas na pele, podendo identificar, através do uso da ferramenta, queixas neurológicas. Isso é importante porque a hanseníase é uma doença primariamente neural, e a busca por esses sinais iniciais da enfermidade, permite o diagnóstico precoce e o tratamento em tempo oportuno, o que possibilita a prevenção de lesões.
Assim, Fernanda Aguiar sempre frisa sobre o cuidado de olhar para a pessoa como um todo. Devido ao contexto estigmatizante da doença, é pertinente considerar que a saúde da pessoa acometida pela hanseníase deve ser vista de uma maneira multifacetada, como esclarece a profissional.
“No mês do Dia Nacional da Saúde (celebrado no dia 5 de agosto), a gente precisa pensar nessas três formas de englobar o conceito: bem-estar físico, mental e social […] Porque o dano psicológico dessas pessoas é algo que fica. Essas sequelas são eternas”, adiciona a profissional, trazendo um apelo ao cuidado integral que é direito daqueles que são afetados pela doença, considerando o impacto social e mental que deriva dessas experiências.
Outro aspecto do cuidado integral à saúde da pessoa acometida envolve a promoção da consciência corporal do indivíduo. Neste contexto, para ensinar as pessoas sobre a atenção necessária para o seu corpo, a fisioterapia vem como um componente essencial na orientação de escolhas saudáveis para a redução do adoecimento.
É isso o que explica Juliana Mesquita Landim, fisioterapeuta da Unidade de Referência Municipal em Hanseníase de Maracanaú (CE), da UBS Narcélio Mesquita Mota. Ela informa que as atividades da fisioterapia na área da Educação em Saúde são também estratégias para a prevenção de incapacidades físicas nos casos de pessoas acometidas pela hanseníase.
“As ações educativas de orientação acerca do autocuidado em Hanseníase, bem como o atendimento humanizado de reabilitação fisioterápica propiciam a redução de incapacidades/deformidades; melhoram a qualidade de vida das pessoas acometidas pela Hanseníase; contribuem para a redução do estigma e sua reinserção social, favorecendo uma visão de saúde que as compreende em sua integralidade e individualidade”, salienta a profissional.
A Educação em Saúde é, de acordo com os relatos aqui trazidos pelas profissionais de diferentes áreas da saúde pública, uma oportunidade de facilitar o acesso à informação da população geral sobre sua saúde. Além disso, a ferramenta pode ser utilizada no combate ao estigma associado à hanseníase, dando autonomia às pessoas acometidas pela doença nas tomadas de decisão em sua própria história, promovendo cuidado com a sua saúde de forma integral e continuada.